Primum non nocere.
Em português: primeiro, não prejudicar. A origem desta expressão é associada a Hipócrates, o pai da Medicina, e está intimamente relacionada com o princípio da não maleficência, que deve estar na base da prática de qualquer profissional de saúde. Este princípio diz-nos que, antes de tentarmos fazer bem a alguém, devemos garantir que não estamos a fazer mal.
Deste modo, na senda das últimas publicações, vamos dar continuidade à análise de um artigo científico que aborda 11 recomendações pelas quais se deve guiar a prática clínica de um fisioterapeuta. E é aqui que entra o princípio da não-maleficência: a segunda recomendação deste artigo diz-nos que o fisioterapeuta deve avaliar a eventual presença de patologia séria (red-flags).
Se traduzirmos à letra, red-flag é uma bandeira vermelha e é um dado clínico que pode estar associado a uma patologia mais grave do que aquela que, à partida, pensaríamos. A presença de um destes dados deve chamar a atenção do/a fisioterapeuta, que deve garantir que a suspeita é avaliada pelo profissional de saúde mais adequado.
Um exemplo muito fácil de se perceber é o facto de um enfarte agudo do miocárdio poder dar origem a dor nos braços ou nas costas. Ora, se o fisioterapeuta tentar “tratar” a dor nos braços ou nas costas, não vai ajudar à resolução das queixas do utente (dado que o que está a causar os sintomas não foi identificado) e, pior do que isso, pode estar a “mascarar” uma patologia séria e a adiar o seu tratamento mais adequado.
Nos casos em que o fisioterapeuta é um profissional de 1.º contacto, ou seja, nas situações em que o utente se desloca ao serviço de fisioterapia sem antes ter consultado o médico, esta avaliação assume uma importância ainda maior.
Vejamos outro exemplo: um utente desloca-se à fisioterapia por queixas de dor nas costas, constante, com início há várias semanas, que tem vindo a agravar e não melhora com medicamentos analgésicos. O que se poderia pensar que seria uma “simples” dor lombar pode ser, afinal, um sintoma de um tumor na medula espinhal.
Quando pensamos na coluna vertebral, alguns exemplos de red-flags são: presença de trauma, febre, dor noturna, sintomas urinários (como incontinência urinária) ou perda de peso súbita.
Mas, caros leitores, acalmem-se. Além de os casos graves serem muito raros, a presença de uma red-flag não é automaticamente sinónimo de uma patologia grave. É apenas um sinal que não deve ser desvalorizado e que merece uma investigação mais aprofundada.