Como se desenvolvem a comunicação, linguagem e fala?
Para a Fala surgir no desenvolvimento da criança é necessário que antes esta apresente competências de Comunicação e Linguagem.
O bebé comunica através do choro quando tem fome, sono, dor/desconforto ou quer atenção. Numa primeira fase esta comunicação é realizada de forma não intencional, sendo que são os pais a dar significado a este comportamento. Assim que vai crescendo, o bebé torna-se cada vez mais competente na comunicação, expressando intenção do que quer transmitir e usando a expressão facial, gestos e postura corporal. O choro passa a apresentar diferentes ritmos, durações e intensidades.
Deste modo inicia-se o desenvolvimento das bases da Linguagem. O bebé começa a entender o que lhe é dito e mais tarde começa a expressar-se através de silabas, palavras e frases. De forma a que o que a criança produza apresente significado, é necessário que haja motivação e interesse em comunicar algo. Verifica-se assim a interligação entre a linguagem e a comunicação.
A transmissão da Linguagem é realizada maioritariamente pela Fala, que corresponde ao ato motor para a produção de sílabas, palavras e frases. Esta forma de comunicação é a mais comum, sendo que também existe a mímica, gestos, escrita ou computador.
Para que a Fala aconteça são necessárias condições físicas e sensoriais, nomeadamente, os pulmões para gerir o fluxo de ar; as pregas vocais para vibrarem e produzirem som; a língua, lábios e palato para modelarem o ar na produção dos sons da fala; o cérebro para receber e enviar mensagens; capacidade sensorial de ver e ouvir os sons da fala e ter consciência dos movimentos da boca para aprender o posicionamento articulatório dos diferentes sons.
Assim, a Fala inicia-se, após comando verbal do cérebro, quando o ar é expirado, passando pelos pulmões, traqueia e pregas vocais, chegando à boca, onde os sons da fala são moldados através de movimentos da língua, lábios, dentes, maxila, mandíbula e palato.
Comunicação, Linguagem e Fala: O que esperar em cada idade?
Comunicação
Entre os 0 e os 2 meses, o bebé exprime-se através de choros diferenciados e produz sons fisiológicos. Movimenta a cabeça na direção do som, reagindo ao som; discrimina as vozes do pai e da mãe e altera resposta de sucção em resposta do som.
Entre os 2 e os 4 meses, produz risos, guinchos, sons guturais e vogais. Apresenta sorriso intencional, o que é fundamental para o desenvolvimento da comunicação. Chora quando é muito estimulado e acalma-se/fica quieto quando falam com ele.
Entre os 4 e os 6 meses meses inicia-se o palreio, o contacto ocular, a proximidade física e as diferenças de frequência e intensidade. Dá-se início à tomada de turnos ou tomada de vez: “ora sorris para mim, ora sorrio eu para ti”. Ainda não existe muito conteúdo linguístico, mas em termos de compreensão o bebé distingue e reage de forma diferente (sorriso ou birra) a tons de voz distintos. Gosta de brinquedos que façam sons.
Entre os 6 e 8 meses, o bebé balbucia (mamama, bababa, papapa), imita sons, ações e gestos familiares, inicia conversa com outra pessoa. Ao nível da compreensão responde ao nome, realizando contacto ocular, responde a palavras que estejam associadas com gestos, identifica a mãe e o pai com o olhar.
Entre os 8 e 12 meses, o bebé usa “jargão infantil” (sons, palavras e frases com diferentes entoações), vira a cara quando não quer algo, faz pedidos olhando alternadamente para o adulto e para o objeto pretendido apontando, diz algumas palavras e imita sons de animais. Reage ao “não”, identifica quando perguntam por familiares próximos e objetos que conheça, bate palmas e acena quando lhe é pedido, cumpre ordens simples e associa palavras a objetos.
Passar tempo com o bebé é essencial para o desenvolvimento da comunicação. Os pais devem responder às suas necessidades, mostrar que estão presentes, aproveitar para brincar sempre que o bebé se mostre disponível e não insistir nas restantes situações, usar gestos e expressões faciais enquanto fazem contacto ocular, entrar na conversa do bebé para alternar a vez do sorriso/palreio e usando o mesmo tom, fazer caretas e barulhos engraçados, aproveitar as rotinas do quotidiano para nomear os objetos que o rodeiam, conversar e estar com as diferentes pessoas da família de forma a experienciar diferentes padrões comunicativos.
Linguagem
A linguagem divide-se nos domínios fonológico, morfossintático, semântico e pragmático.
A Fonologia refere-se aos sons da língua que formam as palavras.
Idade | Desenvolvimento Fonológico |
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8-12 meses | Emite palavras (papá, mamã) |
12-18 meses | Usa todas as vogais, diz palavras e frases. Não produz consoante finais. Faz sons de animais. |
18-24 meses | Usa silabas para dizer palavras e simplifica-as. |
2-3 anos | Omite sons iniciais e finais, silabas e reduz ditongos. Faz substituições de fonemas. |
3-4 anos | Pode omitir uma silaba dentro da palavra ou consoante final. Inicia rimas. |
5-6 anos | Pode omitir o fonema /r/ em grupos consonânticos, alterar a ordem na palavra ou adicionar vogais para os simplificar. |
+6 anos | Divide palavras em fonemas isolados. Palavras desconhecidas podem ser difíceis de articular. |
A Morfologia corresponde à forma como a palavra é constituída (concordância género, número, tempo verbal). A Sintaxe refere-se às regras para ordenar as palavras na frase.
Idade | Desenvolvimento Morfossintático |
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12-18 meses | Frases de uma palavra: holófrase. |
18-24 meses | Combina duas palavras e usa nomes, verbos e advérbios. |
2-3 anos | Constrói frases de duas e três palavras, começa a usar adjetivos, verbos auxiliares, preposições e artigos definidos. Cumpre a concordância género/número. Faz perguntas. Usa frases declarativas, afirmativas e negativas. |
3-4 anos | Constrói frases de três a quatro palavras coordenadas e subordinadas. Explora mais as perguntas, os pronomes e preposições. Conta histórias simples. |
4-5 anos | Domina formas verbais. Formula frases declarativas, interrogativas e imperativas de quatro a cinco palavras. Faz plurais irregulares. |
5-7 anos | Frases compridas e complexas. Usa pronomes, advérbios, preposições e verbos auxiliares e infinitivos. |
A Semântica corresponde ao significado das palavras, frases e discurso.
Idade | Desenvolvimento Semântico |
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12-18 meses | Sabe nomes e verbos associados a pessoas, objetos diários, ações, formas de cumprimentar, sons dos animais favoritos |
18-24 meses | Faz generalizações (p.e. todos os animais de 4 patas chamam-se “cão”). Sabe partes do corpo |
2-3 anos | “Explosão” de vocabulário. Sabe nomes, verbos, advérbios, adjetivos, plurais irregulares. |
3-4 anos | Aumentam os adjetivos e advérbios. Adquire substantivos, pronomes pessoais e possessivos, preposições e conjunções. |
4-5 anos | Aumentam as conjunções. Adquire plurais irregulares. |
5-7 anos | Vocabulário rico. Sabe funcionamento dos objetos, a sua origem e desaparecimento, profissões mais especificas. |
A Pragmática corresponde ao uso da linguagem em contexto social.
Idade | Desenvolvimento Pragmático |
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Recém-nascido | Mostra interesse pela cara, voz e sons da fala. |
1-4 meses | Sorri em resposta ao outro e segue-lhe a cara. |
4-6 meses | Responde a diferentes pessoas. Emite sons que são compreendidos como intenção comunicativa. |
6-9 meses | Reconhece a presença de estranhos. Gosta de músicas. |
9-12 meses | Faz atenção conjunta. Entendo o significado de tarefas da rotina. |
12-18 meses | Comunica através de contacto ocular, da fala e repete. Sorri. Expressa diferentes tons com a mesma palavra. |
18-24 meses | Pede informações e responde a questões. Faz diferentes entoações. Faz jogo simbólico. |
2-3 anos | Sabe aplicar “obrigado”, “se faz favor”. Pede ajuda e faz questões. |
3-5 anos | Cria jogos imaginários. Percebe segundos sentidos. Negoceia e faz pedidos de forma indireta. Fala dos seus sentimentos. Faz perguntas sobre histórias. Mantém conversas. Repete rimas e canções. |
5-7 anos | Fala sobre assuntos e acontecimentos adequados ao contexto. Conta piadas. Reconhece erros no discurso dos outros. |
+7 anos | Desenvolve competências de comunicação. Respeita a opinião e o espaço do outro numa conversa. |
Uma das razões pela qual a linguagem poderá estar alterada, é a presença de perda auditiva. Seguem possíveis sinais de alerta que devem ser avaliados em Otorrinolaringologia:
- Atraso na fala ou linguagem com produção incompleta das palavras
- Não responder quando é chamada em locais ruidosos e questionar frequentemente “ah?” ou “o quê?”
- Respirar pela boca
- Ter pouca atenção
De forma a promover em casa a estimulação da linguagem, é importante que haja momentos de conversação diários com a criança para partilha e diálogo; usar frases simples e dar o modelo correta da produção; dar espaço para a resposta da criança; descrever a rotina e falar sobre o dia-a-dia; descrever as ações e objetos; pedir recados; falar durante algum tempo sobre o mesmo tema; promover a alternância de vez; e dar o modelo correto quando a produção foi incorreta/imatura.
Fala
Os sons da fala não surgem todos no mesmo momento. É esperado que aos 3 anos a criança se faça entender no contexto familiar e com as pessoas mais próximas, que aos 4 anos seja bem entendida por estranhos e aos 5 anos o seu discurso seja compreendido em todas as situações e por todas as pessoas. Poderão adquirir todos os sons da fala até aos 6 anos. Os marcos de desenvolvimento dependem do início da linguagem: se uma criança começa a falar cedo, terá mais tempo para praticar a fala, sendo naturalmente expectável que fale melhor mais cedo também.
Os sons/fonemas variam na complexidade da sua produção.
É esperado que entre os 12 e os 18 meses o bebé diga todas as vogais corretamente. De forma a auxiliar, os pais podem modelar os movimentos da boca, língua e lábios e treinar onomatopeias, nomeadamente, os sons dos animais.
Relativamente às consoantes:
- espera-se que os sons /p/, /b/, /m/, /t/, /d/, /n/, /nh/, /k/, /g/, /v/ e /f/ surjam entre os 18 e 24 meses; os fonemas /z/, /s/, /j/, /ch/ entre os 2 e 3 anos – estes fonemas devem estar adquiridos entre os 3 e os 3 anos e meio;
- espera-se que os sons /l/, /R/ surjam entre os 3 e os 4 anos; os sons /lh/ e /r/ entre os 4 e 5 anos; os fonemas /r/ e /l/ em grupo consonântico (por exemplo: /pr/, /tr/, /dl/, /cl/) entre os 5 e 6 anos – estes sons devem estar adquiridos entre os 5 e 6 anos.
Mover lábios para a frente em beijinho e para trás em sorriso, colocar a língua para cima e para baixo, para a frente e para trás, realizar estalinhos com a língua no céu da boca são alguns exercícios que facilitarão a aquisição de vários pontos articulatórios.
Para dar o modelo correto dos sons da fala, os pais podem exagerar nos pontos articulatórios onde a criança apresentou mais dificuldade, pedir para ver os movimentos que realizaram na boca, estando frente a frente ou virados para um espelho e solicitar à criança a repetição e imitação. O recurso a gestos e onomatopeias associadas aos fonemas auxilia a associação do som a uma imagem; por exemplo: o som /ssss/ é o som da “serpente” e é possível associar o gesto dela a deslizar. Incentivar a produção correta, elogiar o esforço da criança na repetição e dar apoio para não que não se sinta frustrada são estratégias essenciais durante o desenvolvimento da fala.
“Falar à bebé”, tornando o discurso imaturo com recurso a diminutivos, omissões e distorção de sons, fala mais simplificada, não facilita e pode mesmo atrasar a aquisição da linguagem e da fala pois as crianças necessitam do modelo correto por parte dos adultos.
Quando ocorrem alterações estruturais, a fala pode ficar comprometida:
- a oclusão dentária ou encaixe dentário podem estar alterados devido ao uso da chupeta, hábitos orais nocivos (sucção digital, roer unhas, etc), mordida aberta/cruzada/profunda;
- o freio lingual curto pode dificultar a pega durante a amamentação, a alimentação com falhas na mastigação e preferência por alimentos moles, engasgos frequentes, dificuldade na produção de sons que requeiram elevação da língua.
Nestes casos, o encaminhamento para Odontopediatra e/ou Médico Ortopedista Funcional dos Maxilares será essencial.
Sugestões de Atividades
Enquanto pai/mãe poderá usar o recurso a onomatopeias, canto de músicas infantis, exploração de livros de lengalengas e trava-línguas de uma forma geral serão atividades que fomentarão o desenvolvimento correto da Fala. Quando há um ou mais fonemas alterados, é importante que o treino seja direcionado e frequente. Nestes casos, o Terapeuta da Fala orientará as tarefas para casa.
Livros Úteis
Coleção Papa-Sons, da Papa-Letras
À Descoberta dos Sons, de Joana Rombert
Top! Português Pré-Escola
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